UE não reabrirá acordo com Mercosul, mas trabalha em texto adicional
A fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta segunda-feira (30) de que “alguma coisa precisa ser mudada” no acordo entre Mercosul e União Europeia surpreendeu a Comissão Europeia em Bruxelas.
O acordo, que teve sua negociação concluída em 2019, não pode ter o seu texto mudado. Um instrumento adicional, no entanto, está sendo discutido entre os países europeus da união.
Lula falou sobre a mudança após reunião com o primeiro-ministro da Alemanha, Olaf Scholz, no Palácio do Planalto, em Brasília.
“Vamos trabalhar de forma muito dura para concretizar esse acordo [entre União Europeia e Mercosul], mas alguma coisa precisa ser mudada, não pode ser tal como está”, disse o brasileiro. “Vamos fechar esse acordo, se tudo der certo, até o fim desse semestre”, concluiu.
“A Comissão Europeia está totalmente empenhada em finalizar o acordo UE-Mercosul, conforme declarado pela presidente Ursula von der Leyen em Davos em 17 de janeiro de 2023. Esperamos ver progressos decisivos ainda este ano. E, agora, temos uma janela de oportunidade única para finalmente levar adiante o acordo UE-Mercosul”, disse à Folha, nesta terça, a porta-voz da comissão para assuntos de comércio, Miriam García Ferrer.
Finalizado em 2019, o acordo acabou sendo colocado em banho-maria após as atitudes do governo de Jair Bolsonaro em relação ao desmatamento da Amazônia e ao desrespeito ao ambiente terem desagradado os países membros da UE. Houve oposição de blocos de eurodeputados e de governos de França, Áustria e Holanda, por exemplo.
É por isso que foi criado o instrumento adicional, que será anexado ao texto principal. Fontes da comissão familiarizadas com o assunto dizem que, caso os termos do acordo original fossem reabertos, seriam precisos mais dez anos de discussões.
Segundo Ferrer, esse instrumento adicional aborda diretamente as questões de sustentabilidade. “O objetivo é trazer maior clareza e detalhamento sobre os compromissos já negociados por ambas as partes no âmbito do acordo, notadamente no âmbito do Capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável (TSD).”
“Este instrumento recíproco complementaria um pacote de medidas propostas pela Comissão que visam abordar as questões de sustentabilidade em consonância com os nossos objetivos do Pacto Ecológico Europeu. Inclui cooperação bilateral e medidas autônomas da UE sobre desmatamento e due diligence [auditoria].”
Por enquanto, o instrumento está sendo discutido apenas na Europa. Os países do Mercosul ainda não viram nada relativo a isso. Mas a Comissão espera que, em alguns meses, o texto final já posse ser enviada através do Atlântico para aprovação dos países da Mercosul, que são hoje Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.
Mesmo que seja assinado nesse primeiro semestre, como sugeriu o presidente Lula, para entrar em vigor o texto deverá passar por uma série de trâmites.
Atualmente, o trabalho técnico para finalizar a parte comercial do acordo a revisão legal do texto ainda estão em andamento. “Teremos que conciliar os calendários técnico e político antes de podermos definir um cronograma claro para a ratificação e entrada em vigor do acordo”, disse Ferrer.
Uma vez finalizado, o texto será traduzido para todas as línguas da UE. Só então a Comissão pode apresentar as suas propostas de assinatura e conclusão do acordo ao Conselho e ao Parlamento Europeu.
“Reconhecemos plenamente as preocupações com a sustentabilidade e as questões ambientais, em particular o problema do desmatamento em alguns países do Mercosul. Abordar estas preocupações é uma prioridade para a Comissão Europeia”, afirmou Ferrer.
“Somos encorajados pelas promessas feitas pelo novo governo Lula no Brasil para combater o desmatamento. Estamos retomando a conversa sobre o Acordo UE-Mercosul com o novo governo do Brasil e também com os demais membros do Mercosul”, concluiu.
(Ivan Finotti – Folhapress /Foto: Image Source/Folhapress)
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