Se for para piorar sistema, Guedes diz que prefere não fazer reforma tributária nenhuma
O ministro da Economia, Paulo Guedes (foto), afirmou nesta sexta-feira que prefere não prosseguir com uma reforma tributária do que piorar o sistema atual. A declaração é dada em meio às incertezas sobre o rumo de diferentes projetos ligados ao tema em discussão entre governo e Congresso, como a proposta que altera o Imposto de Renda.
“Não vamos fazer nenhuma insensatez. Quero deixar muito claro o seguinte. Eu prefiro não ter uma reforma tributária do que piorar”, afirmou Guedes em audiência no Senado.
O ministro disse que há muitas pessoas reclamando sobre a reforma porque, segundo ele, vão começar a pagar impostos. “Temos que ver mesmo se vai piorar ou não. Se a gente chegar à conclusão que vai piorar, eu prefiro não ter”, reiterou.
“E piorar, para mim, é aumentar imposto, é tributar gente que não pode ser tributada, é fazer alguma coisa que prejudique estado e município -que acho que não estamos prejudicando. A base de arrecadação está crescendo tanto que é hora de reduzirmos um pouco as alíquotas”, disse.
As declarações de Guedes são dadas ao fim de uma semana em que Executivo e aliados tentaram, pela terceira vez, aprovar na Câmara o projeto que altera o Imposto de Renda. Sem acordo em torno do texto e em meio a receios sobre o impacto para os cofres públicos, a discussão foi adiada com apoio da própria base.
Durante as negociações, conforme mostrou o jornal Folha de S.Paulo, Guedes chegou a ensaiar a retirada da proposta. Mas o movimento causou reação de aliados e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) -que tem interesse em ver o projeto aprovado.
Guedes disse que prefere não prosseguir com a reforma caso ela piore o sistema, mas defendeu nesta sexta elementos contidos na proposta do Imposto de Renda -como a redução de impostos sobre empresas e a tributação de dividendos.
Apesar dos sinais de Guedes e de divergências na equipe econômica em torno do projeto, a cúpula do Ministério da Economia ainda defende o andamento da proposta e espera o resultado das negociações com parlamentares para verificar a viabilidade de um texto.
No Congresso, a base do governo ainda busca uma solução e, mesmo após as falas de Guedes, se mostra confiante em alcançar um acordo para colocar o texto em votação.
A busca por um desenho persiste mesmo após o cancelamento de uma reunião que aconteceria com a oposição na próxima terça-feira (24) para tentar conciliar mudanças. Isso porque o encontro desagradou a base do governo na Câmara, que temia as concessões que poderiam ser feitas.
Líder da Oposição na Câmara, o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) criticou o cancelamento. “É lamentável que não se permita que o governo dialogue com a oposição para buscar a melhor solução para a reforma do imposto de renda”, disse.
“Não somos a oposição do quanto pior, melhor. Somos a oposição que dialoga e propõe soluções para tirar o país da crise e para gerar emprego e renda. Infelizmente, o governo não está autorizado por sua base a fazer o mesmo”, afirmou.
O projeto de lei que altera o Imposto de Renda está sob críticas desde que foi enviado ao Congresso, no fim de junho. A versão original do governo trazia a taxação de dividendos acompanhada de uma redução tímida no imposto das empresas, desagradando empresários.
Nas mãos do relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), o texto passou por uma série de alterações. Ele manteve a taxação de dividendos, mas ampliou de forma significativa o corte do imposto sobre as companhias. A partir daí, o texto passou a desagradar também estados e municípios -que passaram a reclamar de perda de receita.
Nesta sexta, Guedes reafirmou sua defesa pelo corte de impostos dizendo que a atividade no ano que vem vai crescer e elevar a arrecadação, permitindo uma redução sem que os cofres públicos sejam afetados. Essa tese é questionada por analistas, que apontam risco para as contas governamentais -já que a proposta tem impacto anual e é baseada em uma melhora de caráter não-permanente.
Guedes falou que nos últimos 40 anos os impostos sobre empresas diminuíram no mundo todo e chegou a citar a política econômica do então presidente americano Ronald Reagan nos anos 1980. “Foi considerado algo extraordinário”, afirmou Guedes.
A política do americano se baseava na ideia de que os cortes de impostos gerariam tanto investimento e crescimento econômico a ponto de compensar seu custo. Porém, após Reagan cortar impostos, a receita tributária despencou e os EUA passaram de maior credor para o maior devedor do mundo.
“Ninguém vai perder. Não vamos (União) perder também e, se perder, prefiro perder um pouquinho. Porque (com) o ritmo de negócios para o ano que vem já vamos arrecadar de novo”, disse. “Vai ter uma boa base, porque estamos trazendo gente que nunca pagou para atualizar, tem atualização de imóveis, tem uma porção (de medidas)”, afirmou.
No caso dos prefeitos, o governo só conquistou apoio -por meio da CNM (Confederação Nacional dos Municípios)- após acenar com mais repasses da União por meio de outro projeto. Guedes disse nesta sexta, inclusive, que está “abraçado” com a Confederação.
Para o ministro, a reforma no Imposto de Renda não é complexa -mas mexe com diferentes interesses. “Tem muito interesse em jogo. É relativamente simples. No mundo inteiro os impostos estão caindo. Nós vamos para a média do mundo. De 34% [a alíquota sobre empresas] para 24%”, afirmou.
Ele diz que o corte é uma “aposta” no futuro crescimento do país. “Vai cair [a carga]. Isso é uma aposta. Uma aposta no vigor, na recuperação econômica, uma aposta de que os impostos, baixando para as empresas, (farão) os investimentos aumentar”, disse.
“Mas a hora de fazer essa aposta é agora. A arrecadação está crescendo, as empresas estão batendo recordes de resultados”, disse.
Ele pediu para governadores e prefeitos não se preocuparem com uma possível perda de recursos com a reforma tributária. “Não se preocupem com perda de receita. Essa não é a realidade. O Brasil está crescendo, saiu do fundo do poço”, disse ele.
O governo também tem interesse no projeto porque ele gera R$ 20 bilhões de respaldo jurídico para o Auxílio Brasil, o novo Bolsa Família. Isso porque a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) exige uma compensação orçamentária para criar novas despesas.
Guedes ainda pediu para ser interrompida o que chamou de “guerra fratricida” para que o país tenha sucesso. “O Brasil está tão dividido que quando sai uma notícia que o Brasil voltou em V, o pessoal fica depressivo. Aí quando vem a notícia que pode ser que no ano que vem [o país] não cresça, aí o pessoal fica eufórico [e diz] ‘nós vamos tirar o presidente’. Isso é doentio”, disse.
“Se tem uma coisa que me entristeceu na pandemia foi ver gente subindo em cadáver para fazer política. Narrativa falsa de um lado e de outro. O Brasil não está voando nem condenado”, afirmou.
Além da reforma no Imposto de Renda, outras propostas ligadas ao sistema tributário tramitam no Congresso à espera de uma aprovação. Entre elas, duas PECs (propostas de emenda à Constituição) que fundem de maneira ampla tributos federais, estaduais e municipais.
O ministro rechaça a reforma ampla, pois entende que as discussões geram risco de a União ter que pagar centenas de bilhões a estados e municípios como compensação por eventuais perdas. Ele afirmou considerar “impossível” fazer uma reforma dessa magnitude de uma vez e defendeu mudanças de forma fatiada.
Mesmo assim, prometeu aos senadores fazer uma proposta em 30 ou 60 dias para a criação de uma reforma mais abrangente desde que com alguns condicionantes, como não haver isenções para grupos empresariais específicos e não criar mais repasses da União para estados e municípios. “Se não for um expediente para fazer a União pagar recursos, quero ver acontecer”, afirmou. (Fábio Pupo, Danielle Brant e Washington Luiz–Folhapress)