Risco de inflação estourar limite da meta é próximo de 100% pelo 2º ano consecutivo, diz BC
O Banco Central admitiu que a probabilidade de a inflação ficar acima do teto da meta neste ano está próxima de 100%, de acordo com o relatório trimestral divulgado nesta quinta-feira (30).
No documento anterior, em março, o risco era de 88% no cenário tido como mais provável pela autoridade monetária, com base na trajetória descendente para o preço do barril de petróleo. No segundo cenário considerado, por sua vez, a chance era de 97%.
Para 2023, a estimativa também aumentou, passando de cerca de 12% para em torno de 29%.
Segundo informou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 9 de junho, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) atingiu 11,73% no acumulado de 12 meses até maio.
Com a entrada dos dados de junho, o IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) passou a acumular alta de 12,04% em 12 meses ao subir 0,69%.
Conforme divulgado na apresentação preliminar do relatório, na última quinta (23), nas projeções de curto prazo, o BC considera altas de 0,81% em junho, de 0,84% em julho e de 0,33% em agosto.
“Caso se concretize, a inflação de 1,99% no trimestre implicará leve recuo da inflação acumulada em doze meses (11,73% em maio e 11,31% em agosto)”, disse a autoridade monetária no relatório.
O BC projeta ainda o pico de inflação de 12% no segundo trimestre e queda para 8,8% no fim deste ano. Para o cálculo, foi usado o conjunto de informações disponíveis até a última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), em 14 e 15 de junho.
Entre os principais fatores de revisão dos números de 2022 para cima, a autoridade monetária lista surpresas inflacionárias, revisão das projeções de curto prazo, elevação do preço do petróleo, propagação via inércia inflacionária das pressões correntes, crescimento das expectativas de inflação da pesquisa Focus, indicadores de atividade econômica mais fortes do que o esperado e utilização de taxa de juros real neutra maior do que a no relatório anterior.
“Entre os preços administrados, destacam-se, como itens inflacionários para 2022, combustíveis, produtos farmacêuticos, plano de saúde, emplacamento e licença e taxa de água e esgoto”, afirmou.
No sentido contrário, segundo o BC, atua “energia elétrica em função do comportamento das bandeiras tarifárias e da incorporação de estimativa dos efeitos do Projeto de Lei nº 1.280/2022”, que disciplina a devolução acelerada do PIS/Cofins pago a mais pelos consumidores.
No cenário de referência, que utiliza trajetória para o preço do petróleo seguindo aproximadamente a curva futura pelos próximos seis meses, a autarquia não incorporou o impacto das medidas que tramitavam no Congresso -e já foram aprovadas- mirando reduzir impostos sobre combustíveis, energia elétrica e telecomunicações.
“As projeções aqui apresentadas dependem ainda de considerações sobre a evolução das reformas e ajustes necessários na economia. Seus efeitos sobre as projeções são capturados por meio dos preços de ativos, do grau de incerteza, das expectativas apuradas pela pesquisa Focus e pelo seu efeito na taxa de juros estrutural da economia”, disse.
“Além desses canais, a política fiscal influencia as projeções condicionais de inflação por meio de impulsos sobre a demanda agregada”, continuou.
O IPCA estimado para o fim de 2022 é bem superior à meta fixada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) de 3,5% -com 1,5 ponto percentual de tolerância para cima e para baixo.
Quando as estimativas se confirmarem, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, deverá escrever uma carta ao ministro da Economia explicando as razões para o descumprimento do objetivo pelo segundo ano consecutivo.
A inflação fechou 2021 em 10,06%, enquanto o centro da meta era 3,75%. Foi a maior alta desde 2015. Como justificativa, o chefe da autarquia escreveu que o IPCA de dois dígitos era culpa do fenômeno global.
Nas projeções do BC, a inflação cai para 4% em 2023 e 2,7% em 2024, diante de metas de 3,25% e 3%, respectivamente.
O relatório trimestral de inflação, divulgado com uma semana de atraso devido à greve dos servidores do BC, trouxe também a revisão do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) para 2022, que saltou de 1% para 1,7%.
O dado já havia sido antecipado na semana passada pelo diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, na apresentação preliminar.
Segundo Guillen, o consumo das famílias foi o principal fator para a revisão para cima do PIB, seguido em menor grau pelo impacto de exportações.
“Acho que tem mais a ver com o que a gente observou no primeiro trimestre e com dados preliminares do segundo trimestre do que com uma mudança prospectiva de crescimento”, disse.
O diretor ressaltou que o BC espera uma desaceleração da atividade econômica nos próximos trimestres, quando a economia sentirá o efeito do choque de juros. Na última reunião, o Copom elevou a taxa básica de juros (Selic) a 13,25% ao ano.
“Grande parte do aperto monetário ainda vai se fazer presente tanto na inflação quanto no crescimento”, afirmou.
O relatório também acrescenta que contribuirão para o arrefecimento do consumo no segundo semestre “alterações no calendário de transferências governamentais às famílias, como a antecipação do 13º salário dos aposentados e pensionistas do INSS e a concentração do abono salarial no primeiro trimestre”, que terão impacto negativo sobre a renda das famílias.
(Nathalia Garcia – Folhapress / Foto: Marcello Casal Jr – Agência Brasil)