Republicanos estendem racha histórico pelo 2º dia, e Câmara dos EUA segue sem presidente
Sem avançar nas negociações para se eleger presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, o deputado republicano Kevin McCarthy perdeu a quarta votação no começo da tarde desta quarta (4), escancarando as fissuras na legenda e estendendo o caos no Legislativo pelo segundo dia consecutivo.
Com a posse do novo Congresso após as eleições legislativas de novembro, o Partido Republicano voltou a ter maioria na Câmara após quatro anos e deveria ter eleito ainda na terça um novo presidente da Casa.
Mas McCarthy, líder da legenda entre os deputados, sofreu forte oposição interna e não alcançou os 218 votos necessários na terça (3), em uma performance considerada humilhante e que levou a Câmara a um impasse que não ocorria desde 1923. Foram três votações e três derrotas acachapantes, que começaram com 19 dissidências e terminaram com 20 votos contrários a ele.
Nesta quarta, a quarta votação acabou mais uma vez com 20 votos contrários e houve uma abstenção.
É um número alto dada a estreita maioria da legenda. Os republicanos têm 222 cadeiras da nova Câmara, e o novo presidente precisa de 218 votos, ou seja, só pode ter no máximo quatro oposições, de modo que o político precisaria convencer pelo menos 16 deputados se quiser ser eleito.
A falta de consenso na escolha trava a pauta na Câmara, e os deputados têm de votar quantas vezes for preciso até que o novo presidente seja escolhido. A última vez que não houve eleição para presidente logo na primeira votação foi em 1923, quando a seleção de um republicano demandou nove rodadas.
A história mostra, porém, que McCarthy pode ainda ter chance. Naquele ano, um século atrás, o republicano Frederick H. Gillett insistiu em seu nome e foi eleito após perder oito votações.
McCarthy teve oposição da ala ultraconservadora do partido. Das 20 pessoas que votaram contra ele, 19 são ligados ao Freedom Caucus (bancada da liberdade), grupo republicano de ultradireita. Além disso, 12 repetem o discurso de que a eleição de 2020, quando Donald Trump perdeu para Joe Biden, foi fraudada.
A maioria também teve sua eleição apoiada por Trump.
Na manhã desta quarta, o ex-presidente manifestou apoio a McCarthy. “Algumas conversas realmente boas aconteceram ontem à noite, e agora é hora de todos os nossos ÓTIMOS deputados republicanos VOTAREM EM KEVIN, FECHAR O NEGÓCIO, CONQUISTAR A VITÓRIA E ASSISTIR A LOUCA NANCY PELOSI [ex-presidente da Câmara] VOAR DE VOLTA PARA CASA PARA UMA CALIFÓRNIA MUITO FALIDA”, escreveu em rede social. “REPUBLICANOS, NÃO TRANSFORMEM UM GRANDE TRIUNFO EM UMA DERROTA GIGANTE E VERGONHOSA. É HORA DE COMEMORAR, VOCÊS MERECEM. Kevin McCarthy fará um bom trabalho, e talvez até um ÓTIMO TRABALHO – APENAS OBSERVE!”
Importante aliado de Trump durante o governo do republicano, McCarthy chegou a ecoar as alegações falsas de que o ex-presidente venceu a eleição de 2020 antes que o resultado fosse confirmado. Com a invasão do Capitólio em 2021, quando uma multidão insuflada por Trump tentou impedir à força a confirmação da vitória de Biden, McCarthy se voltou contra Trump e afirmou que ele era responsável pelo ataque. Habilidoso politicamente, porém, o líder soube ler o cenário e se reaproximou do ex-presidente.
Quem também se manifestou foi Biden, que disse nesta quarta que acha “muito constrangedor que esteja demorando tanto”. O democrata será o principal alvo dos republicanos na Câmara, que, agora com maioria, prometem abrir investigações contra o governo e travar a pauta legislativa da Casa Branca.
O republicano, porém, permanece firme em seu propósito de se tornar presidente da Câmara, um dos cargos mais altos na cadeia de poder dos EUA, segundo na linha de sucessão presidencial, atrás apenas da vice-presidente, Kamala Harris.
Caixas e caixas de pizza chegaram ao escritório de McCarthy na noite de terça enquanto seu grupo político retomava as negociações para elegê-lo, após a performance considerada humilhante nas primeiras votações. Ele tem cedido às pressões da ala conservadora e feito promessas de mais poder ao grupo nas comissões e até de permitir na regulação interna da Casa de um grupo pequeno de deputados tentar demover o presidente da Câmara a qualquer momento de seu mandato.
Apesar do impasse, ainda não há um nome claro entre os republicanos que possa vencer McCarthy, mas a falta de consenso levanta especulações. O mais citado até aqui Steve Scalise, deputado por Louisiana e número 2 do partido na Câmara. Ao contrário de McCarthy, ele não teve oposição interna eleição para a liderança da legenda na Casa, em novembro, e é considerado mais conservador do que o principal candidato, agradando o Freedom Caucus.
A falta de um consenso dentro da legenda contrasta com o Partido Democrata. Em novembro, a eleição de Hakeem Jeffries como novo líder, para suceder a poderosa Nancy Pelosi, não teve contestação. Nas votações para presidente da Câmara, como era esperado, todos os 212 deputados eleitos da legenda votaram em Jeffries –algo difícil de se concretizar sem a maioria. Também não há hoje outro nome suficientemente forte entre os democratas para desafiar uma tentativa de reeleição de Biden, que terá quase 82 anos no próximo pleito.
Os republicanos fizeram referência a esse contraste ao lançar McCarthy à presidência pela quarta vez nesta quarta. “É claro, parece uma bagunça. Mas a democracia é uma bagunça por definição”, disse o deputado Mike Gallagher.
(Thiago Amâncio – Folhapress /Foto: Niyi Fote/Thenews2/Folhapress)
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