Relator afirma que Câmara vota reforma tributária na 1ª semana de julho; veja diretrizes

Relator afirma que Câmara vota reforma tributária na 1ª semana de julho; veja diretrizes

Em uma tentativa de deslanchar as negociações da reforma tributária, o relator na Câmara dos Deputados, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), apresentou nesta terça-feira (6) as linhas gerais da proposta e afirmou que a migração para o novo sistema pode ter uma transição maior para acomodar benefícios fiscais já concedidos por estados e municípios e que foram convalidados pelo Congresso Nacional até 2032.

O tema é um dos principais impasses que podem travar o avanço da reforma no Congresso Nacional. A informação da negociação de uma transição maior foi antecipada pela Folha.

O documento com as diretrizes foi aprovado de forma simbólica pelos deputados e traz princípios gerais que são consenso entre parlamentares. Mas a materialização do texto da PEC (proposta de emenda à Constituição) ainda depende de novas conversas com as bancadas.

Segundo Ribeiro, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que o substitutivo será apreciado no plenário na primeira semana de julho. Para ser aprovada, a PEC precisa de ao menos 308 votos favoráveis, em dois turnos.

Ao iniciar a leitura do relatório, Ribeiro defendeu a importância da aprovação da reforma tributária após décadas de tentativas fracassadas. “Essa não é uma reforma de governo. Não é uma reforma ideológica. Não é reforma de direita, não é reforma de esquerda, é uma reforma estrutural do Estado brasileiro”, disse.

Ele também elogiou o ministro Fernando Haddad (Fazenda), que desde a transição elencou a proposta como uma de suas prioridades na condução da política econômica. “Quero elogiar o ministro Haddad, que tem real dimensão da importância de uma reforma tributária para o país”, afirmou.

O secretário extraordinário da reforma tributária da Fazenda, Bernard Appy, acompanhou a apresentação do relatório.

Em um momento de dificuldades de articulação da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que haverá forte esforço em prol da aprovação da reforma. “Nós vamos mobilizar nossa base, mobilizar os líderes, mobilizar o governo para dar legitimidade política e arrumar voto para que vocês coroem esse extraordinário trabalho”, afirmou.

Um dos pilares do relatório do GT é a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que será chamado de IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). O sistema será dual: significa que uma parcela da alíquota será administrada pelo governo federal, e a outra, por estados e municípios.

Também será criado um imposto seletivo, que não tem uma finalidade arrecadatória e é aplicado sobre bens e serviços cujo consumo o governo pretende desestimular (como cigarros e bebidas alcoólicas). Alguns parlamentares defendem também aplicá-lo para coibir atividades poluentes.

O relatório não indica quais seriam as alíquotas de cada um dos novos impostos, o que ainda vai depender de cálculos efetuados em conjunto com o Ministério da Fazenda.

A cobrança do tributo será realizada onde ocorre o consumo (destino), em substituição ao modelo atual de incidência no local de produção (origem). Haverá um período de transição até que haja a migração completa para o novo modelo.

A unificação dos impostos, porém, não pode servir de pretexto para acabar com benefícios fiscais concedidos por estados e municípios e que já foram convalidados pelo Congresso até 2032. A avaliação no Legislativo é de que é preciso dar segurança jurídica às empresas contempladas. Por isso, o relatório indica que eles serão mantidos, mas sem detalhar de como isso será feito.

Interlocutores ouvidos pela Folha afirmaram que se discute um período de transição mais longo para ICMS e ISS para conciliar a implementação do novo sistema e a necessidade de dar segurança jurídica a esses incentivos.

No relatório da comissão mista apresentado em 2021, a previsão era que a migração para o novo sistema tributário ocorresse em seis anos -dois anos para a fase federal e outros quatro anos para a unificação dos tributos de estados e municípios. Agora, a discussão é prolongar a segunda fase para oito anos, totalizando uma transição de uma década, até 2034 (quando os incentivos já terão terminado).

A transição maior ajuda a diluir a fatura da convalidação, que precisaria ser bancada pela União no caso de uma unificação mais célere dos impostos estaduais e municipais. Cálculos preliminares indicam que a conta passa dos R$ 150 bilhões ao ano, fruto da concessão desenfreada de incentivos por governadores e prefeitos em meio à guerra fiscal.

Segundo Ribeiro, a maior parte dos benefícios foram concedidos via ICMS, embora também haja incentivos da União e dos municípios. “Lógico que a transição também serve para calibrar a quantidade de recursos [para arcar com a convalidação]. À medida que antecipo a extinção do imposto, evidente que eu aumento o custo”, confirmou o relator. “Ou é aporte, ou é transição”, acrescentou, admitindo que o período de migração para estados e municípios pode ser mais longo.

Em relação ao desenho do IBS, o grupo de trabalho prevê a fixação de uma alíquota padrão e de alíquotas reduzidas para setores específicos, como saúde, educação, transporte coletivo e a produção rural. O grupo de trabalho também incluiu a possibilidade de contemplar a aviação regional.

Haverá ainda tratamento específico para segmentos como combustíveis e lubrificantes, bens imóveis, serviços financeiros, seguros e cooperativas.

Os parlamentares também querem evitar um aumento da tributação sobre os produtos da cesta básica, hoje desonerados ou com menor carga.

O relatório sugere medidas para mitigar a chamada regressividade da tributação sobre o consumo, que onera proporcionalmente mais as famílias de menor renda. O governo defende o chamado “cashback”, termo em inglês que representa a devolução do tributo pago em dinheiro para o consumidor, ideia acatada pelo relatório do GT.O documento não detalha o modelo a ser adotado.

Apesar desses regimes específicos, o relatório sugere uma tributação “isonômica”, que alcance inclusive bens e serviços fornecidos por meio de plataformas digitais. “A tributação vai alcançar inclusive aquelas sediadas no exterior”, diz o documento.

FUNDO DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Na tentativa de reduzir resistências dos estados e municípios, o relatório elenca como diretriz a criação do FDR (Fundo de Desenvolvimento Regional) para assegurar a existência de instrumentos de incentivo à atividade econômica.

O relatório sugere que o FDR seja financiado “primordialmente” por recursos da União. Há pleitos para que o governo federal banque sozinho uma fatura na casa de R$ 50 bilhões a R$ 60 bilhões ao ano.

Governadores e prefeitos das regiões Sul e Sugeste também querem acessar essas verbas, uma vez que Norte, Nordeste e Centro-Oeste já possuem outros instrumentos de fomento regional, como fundos constitucionais.

O documento ainda recomenda que esse repasse anual seja classificado como despesa obrigatória e fique de fora do limite de despesas a ser instituído pelo novo arcabouço fiscal.

Appy confirmou que a União bancará uma parte do fundo, mas não detalhou valores. Ele também rejeitou o risco de uma fatura ilimitada, já que a despesa ficará fora do novo teto.

“Primeiro ponto, não é um valor ilimitado. A União tem a intenção de apoiar o Fundo de Desenvolvimento Regional, mas não é um valor ilimitado. E isso será feito de forma a não comprometer a trajetória da dívida pública. Será feito de forma fiscalmente responsável”, afirmou o secretário.

REGIMES TRIBUTÁRIOS FAVORECIDOS

Os integrantes do grupo de trabalho decidiram manter os benefícios fiscais da Zona Franca de Manaus, um dos pontos que estava travando as negociações.

O Simples Nacional, regime simplificado de recolhimento de tributos para micro e pequenas empresas, também será mantido, mas o relatório sugere que as companhias tenham maior flexibilidade para aderir ou não ao novo sistema do IVA -o que pode ser vantajoso para quem fornece bens ou serviços para outras empresas, uma vez que elas poderiam obter créditos a partir dos insumos e abatê-los do imposto a ser recolhido.

TRIBUTAÇÃO DA RENDA E DO PATRIMÔNIO

Embora a PEC da reforma tributária tenha como foco principal os tributos sobre o consumo, o relatório sugere a inclusão de algumas mudanças na cobrança de impostos estaduais e municipais sobre renda e patrimônio, de forma a torná-los mais progressivos e mais flexíveis.

Uma das recomendações é estender o IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) para veículos aquáticos (como iates e lanchas) e aéreos (como jatos particulares). A atual interpretação do STF (Supremo Tribunal Federal) é que o imposto apenas incide sobre veículos automotores terrestres.

Para o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação), a recomendação do grupo é determinar que a cobrança seja progressiva em razão do valor da herança ou doação, permitindo uma carga maior sobre aquelas de alto valor.

O relator ainda ressaltou que o grupo vai atender a um pleito da CNM (Confederação Nacional dos Municípios) e autorizar os Executivos municipais a atualizarem a base de cálculo do IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana) por meio de decreto, a partir de critérios previamente estabelecidos em lei municipal.

AS DIRETRIZES DA REFORMA TRIBUTÁRIA

– PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) serão substituídos por um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) e se chamará IBS (Imposto sobre Bens e Serviços)
– Sistema dual: uma parcela do IBS de competência da União e outra compartilhada entre estados e municípios
– Adoção de uma alíquota padrão, com possibilidade de alíquotas reduzidas para saúde, educação, transporte público coletivo urbano, semiurbano ou metropolitano e aviação regional, bem como a produção rural
– Tratamento específico para operações com bens imóveis, serviços financeiros, seguros, cooperativas, combustíveis e lubrificantes
– Haverá um Imposto Seletivo, com objetivo de desestimular consumo de bens e serviços considerados nocivos à saúde e ao meio ambiente
– Cobrança do imposto no destino, onde ocorre o consumo (destino), em substituição ao modelo atual de incidência no local de produção (origem)
– Não cumulatividade de impostos
– Tributação de bens e serviços ofertados em plataformas digitais, inclusive aquelas sediadas no exterior
– Sistema de cashback, com devolução de parte dos impostos sobre consumo para a parcela mais vulnerável dos consumidores
– Manutenção da Zona Franca de Manaus e do Simples Nacional
– Criação de um Fundo de Desenvolvimento Regional para permitir a concessão de novos incentivos à atividade econômica em determinadas regiões, abastecido com recursos financiados “primordialmente” pela União
– Previsão de cobrança de IPVA sobre lanchas, iates e jatos particulares
– Autorização para prefeitos atualizarem o valor venal de imóveis (para fins de cálculo do IPTU) por meio de decreto, a partir de critérios estabelecidos em lei municipal. Hoje, prefeituras dependem de aval do Legislativo local para efetuar essa atualização

QUAIS SÃO OS PRÓXIMOS PASSOS?

O relator da reforma tributária, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), deve fazer rodadas de conversa com as bancadas parlamentares na Câmara e trabalhar no texto substitutivo à PEC (proposta de emenda à Constituição) que será votado em plenário.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou que a apreciação da proposta deve ocorrer na primeira semana de julho. A PEC precisa ser aprovada por 308 deputados, em dois turnos de votação. Depois disso, o texto segue para o Senado, onde terá de ser aprovado por 49 senadores, também em dois turnos.

(Idiana Tomazelli e Danielle Brant – Folhapress /Foto: Edilson Rodrigues – Agência Senado)

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