Pastores suspeitos de corrupção no MEC visitaram Planalto 35 vezes sob Bolsonaro
Os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos, apontados como pivôs do escândalo do balcão de negócios do Ministério da Educação, estiveram 35 vezes no Palácio do Planalto desde o começo do governo.
Moura esteve 35 vezes no local, sendo 10 acompanhado de Santos.
O último registro é de 16 de fevereiro deste ano, pouco mais de um mês antes de o jornal Folha de S.Paulo divulgar o áudio no qual o então ministro Milton Ribeiro (foto) afirma privilegiar os repasses para municípios indicados pelo pastor Gilmar Santos, a pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL).
O documento divulgado pelo Gabinete de Segurança Institucional nesta quinta-feira (14), um dia após se recusar a divulgar as informações, diz que os pastores estiveram duas vezes no gabinete adjunto de agenda do gabinete da Presidência da República -local onde, normalmente, se vai para solicitar um horário com o presidente.
Os dois encontros foram registrados pela agenda oficial do Planalto. Em 25 de abril de 2019, com pouco menos de cinco meses de governo, Moura e Santos rezaram e tiraram fotos com Jair Bolsonaro.
“Presidente da República, Jair Bolsonaro, e o Vice-Presidente da República, Hamilton Mourão, durante encontro com Pastor Gilmar dos Santos, Presidente da Igreja Assembleia de Deus de Missão de Todos os Santos; Pastor Airton Moura Correia, Igreja Assembleia de Deus de Missão de Todos os Santos”, registrou o Planalto.
O segundo registro foi em 14 de outubro de 2020, quando Arilton esteve com Bolsonaro.
A dupla frequentou mais o Palácio do Planalto no primeiro ano de governo de Bolsonaro, quando foram 27 vezes lá. Em 2020, há apenas um registro no documento divulgado pelo GSI.
No ano passado, estiveram cinco vezes lá. Neste ano, Arilton foi duas vezes à Casa Civil de Ciro Nogueira, sendo uma delas acompanhado de Gilmar.
A lista indica ainda que os pastores tiveram reuniões em pastas comandadas por quatro ministros: Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Onyx Lorenzoni (então na Casa Civil), Santos Cruz (então na Secretaria de Governo) e Luiz Eduardo Ramos (sucessor de Santos Cruz).
Com exceção dos encontros registrados em fotografias ou postagens em redes sociais, não é possível saber quem participou das agendas com os dois pastores dentro das pastas sediadas no Planalto.
Isso porque é possível que a primeira visita seja registrada como sendo a um ministro no Planalto, e depois os visitantes sigam acompanhados para outro gabinete ou ministério.
Arilton também esteve com o vice-presidente Hamilton Mourão por duas vezes. Uma delas, acompanhado de Gilmar.
O local mais visitado nesses anos foi a Casa Civil, onde o pastor Arilton esteve 13 vezes e Gilmar, seis.
Das visitas de Arilton, 7 foram quando Onyx Lorenzoni era ministro e outras 6 com Ciro Nogueira no comando da pasta.
O pastor ainda esteve 10 vezes na Secretaria de Governo, 1 delas acompanhando de Santos. Das visitas, 9 foram na gestão do general Carlos Alberto dos Santos Cruz e 1 já com Luiz Eduardo Ramos como ministro.
Pastor que mais visitou o Planalto, Moura foi apontado pelo prefeito Gilberto Braga (PSDB), do município maranhense de Luis Domingues, como o autor do pedido de 1 kg de ouro em troca da liberação de verbas de obras de educação para a cidade.
A declaração do prefeito foi dada ao jornal O Estado de S. Paulo, e a Folha de S.Paulo confirmou com outras duas pessoas presentes no local onde o pedido de propina foi feito.
Moura também foi citado no depoimento do presidente do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), Marcelo Lopes da Ponte, à CGU (Controladoria-Geral da União).
Indicado pelo centrão e ex-assessor de Ciro Nogueira, Ponte disse que o pastor fez “insinuações” de pagamento de propina durante encontros entre os dois no ano passado.
“As insinuações do sr. Arilton nunca trataram de números, mas sim de frases como ‘me ajude que eu te ajudo'”, afirmou Ponte no depoimento em outubro de 2021.
Mesmo após a instalação da investigação pela CGU, em agosto de 2021, Moura ainda esteve no Palácio do Planalto outras seis vezes. Sempre em visitas à Casa Civil comandada por Nogueira.
As informações sobre as visitas foram divulgadas pelo GSI nesta quinta, após a pasta comandada por Augusto Heleno ter se recusado a divulgar informações referentes a reuniões e visitas dos pastores ao Palácio do Planalto.
Os registros haviam sido pedidos pelo jornal O Globo, através da Lei de Acesso à Informação. Foram solicitados dados referentes às entradas e saídas dos referidos pastores ao Planalto, incluindo quando as visitas foram feitas diretamente ao gabinete de Bolsonaro.
Ao chegar ao Palácio do Planalto, todos os visitantes devem se identificar, apresentar documentos de identificação e apontar o gabinete ou escritório de destino.
As entradas, normalmente, precisam ser autorizadas pelos responsáveis pela área que será visitada.
Durante a tramitação do processo do pedido, via a Lei de Acesso à Informação, o Gabinete de Segurança Institucional apresentou um parecer alegando que não pode fornecer a informação. Cita a legislação, na qual compete ao gabinete a segurança do Palácio do Planalto, do presidente da República e de seus familiares, entre outros.
“Do exposto, fica clara a impossibilidade do fornecimento dos dados pessoais solicitados para outros fins que não a segurança na Presidência da República”, afirma a resposta oficial ao pedido.
Os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos estão no centro do escândalo do balcão de negócios do MEC. Os dois foram apontados como operadores do esquema, negociando com prefeitos a distribuição de recursos do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), o que muitas vezes teria ocorrido em troca de propina.
Prefeitos de algumas cidades confirmaram os pedidos de propina e a intermediação em audiência na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado.
O caso ganhou novas proporções após o áudio divulgado pela Folha de S.Paulo.
“Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, diz o então ministro na conversa em que participaram prefeitos e os dois religiosos.
“Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, diz o ministro.
Milton Ribeiro também indica haver uma contrapartida à liberação de recursos da pasta. “Então o apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção das igrejas”.
O ministro foi exonerado uma semana após a divulgação do áudio.
A oposição, no entanto, esteve perto de colher as assinaturas para instalar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar as irregularidades nos repasses. O governo contra-atacou, conseguindo retirar as assinaturas e conseguindo protocolar seu próprio requerimento de CPI, para investigar as obras inacabadas, durante o governo PT, principalmente.
Ex-ministro da Secretaria de Governo, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz afirmou não se lembrar de ter conversado pessoalmente com os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura. Os registros de entrada no Palácio do Planalto indicam que o primeiro esteve uma vez no gabinete da Secretaria de Governo durante a gestão do militar, enquanto Arilton Moura teria sido recebido nove vezes.
“Eu não lembro de nunca ter falado com aquela pessoa [Arilton Moura]. Pode ser que tenha ido lá se apresentar. Não lembro mesmo de ter falado nada de relevante. Vi que houve dias em que ele foi de manhã e de tarde, ficou duas horas lá dentro. Deve ter entrado no Palácio e ficou lá dentro”, afirmou.
“Eu não lembro dessa figura, não lembro nem da pessoa, muito menos de algum assunto tratado. Eu não teria nada para falar com ele duas horas de manhã e duas horas de tarde”, completou. (Marianna Holanda – Folhapress/PD/Foto: Valter Campanato – Agência Brasil)