Oposição tenta desidratar PEC dos precatórios, e aliados de Bolsonaro querem mais gastos para 2022
A oposição ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) quer derrubar parte da proposta que cria um teto para o pagamento de precatórios -dívidas reconhecidas pela Justiça- e abre mais espaço no Orçamento para gastos em ano eleitoral.
Para tentar garantir a aprovação do projeto, aliados do governo se reuniram com bancadas partidárias, buscando alinhar a base do Palácio do Planalto. A previsão é que agora o projeto seja votado nesta nesta quarta-feira no plenário da Câmara.
A decisão da oposição e o adiamento da votação, que era esperada para esta terça-feira, foram antecipados pela coluna Painel, do jornal Folha de S.Paulo
A PEC (proposta de emenda à Constituição) foi aprovada na noite de quinta-feira (21) na comissão especial da Câmara. Agora, o texto precisa do apoio de pelo menos 308 votos dos 513 deputados em votação em dois turnos.
Inicialmente, a PEC foi editada para alterar as regras de pagamento de precatórios. Foi incluído no texto, porém, um dispositivo para driblar a regra do teto de gastos. Isso garante mais recursos ao governo já em 2022, ano em que Bolsonaro pretende concorrer à reeleição.
Nos bastidores, líderes governistas e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), atuam para alcançar o placar necessário na votação e garantir que o governo tenha dinheiro para gastar mais no ano que vem. Para isso, se reuniram com representantes de partidos da base e independentes para explicar a proposta e fazer um balanço prévio dos votos.
O conjunto das alterações previstas -mudança na regra dos precatórios e no teto- cria um espaço orçamentário de R$ 83 bilhões no ano eleitoral de 2022, de acordo com o relator da PEC, deputado Hugo Motta (PB), que é líder do Republicanos.
Esses recursos viabilizam a ampliação do Auxílio Brasil, o novo programa social com a marca de Bolsonaro, além de permitir mais dinheiro para o fundo de financiamento das eleições e emendas parlamentares, que são usadas por deputados e senadores para enviar verba para obras e projetos em suas bases eleitorais.
Partidos de oposição, como o PT, se posicionaram contra a parte da proposta que adia o pagamento de precatórios. “Isso vai criar uma bola de neve. Os precatórios têm que ser pagos”, disse o vice-lider do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP).
“Essa ideia é fiscalmente irresponsável”, afirmou o líder da oposição, deputado Alessandro Molon (foto) (PSB-RJ).
A PEC cria um limite para despesas com sentenças judiciais dentro do teto de gastos -regra que impede o crescimento das despesas acima da inflação. Pela proposta, a parcela excedente a esse limite será paga futuramente ou pode, em condições específicas, ser quitada fora do teto de gastos.
O cálculo do limite de pagamento de precatório previsto no projeto usa como base o montante pago em sentenças judiciais em 2016 (ano de criação do teto de gastos federais) e o corrige pela inflação. O valor resultante passaria a ser o máximo a ser pago pela União em precatórios dentro do teto.
Essa medida, segundo o relator, tem potencial de retirar do teto de gastos cerca de R$ 44 bilhões no Orçamento de 2022.
A outra medida, que trata da alteração no cálculo do teto, permite uma expansão de aproximadamente R$ 39 bilhões nos gastos do próximo ano. Partidos de oposição criticam o limite de despesas federais desde a criação da norma fiscal e, portanto, planejam votar a favor da flexibilização do teto.
Motta se reuniu nesta terça com representantes da oposição. Apesar das divergências, o relator disse que não pretende fazer alterações no texto. “Vou discutir com os técnicos do governo, mas a ideia é votar no plenário o texto que passou pela comissão”.
O relator e aliados do governo também conversaram com deputados da base e independentes ao governo. O objetivo foi explicar a proposta e fazer um balanço de votos antes da sessão no plenário.
Nesta terça, Lira falou sobre o adiamento da votação. “As incertezas até a aprovação do texto vão continuar, as versões vão continuar, mas amanhã [quarta] nós teremos um texto aprovado ou não, para dar uma solução ao espaço discricionário do teto, e a criação de um programa temporário”, disse Lira, se referindo ao Auxílio Brasil.
A decisão de adiar também teve relação com o quórum da sessão, de cerca de 400 deputados. Como o mínimo para aprovar a PEC eram 308 votos, Lira poderia amargar nova derrota caso insistisse em pautar o texto -na semana passada, a PEC que mudava a composição do Conselho Nacional do Ministério Público foi rejeitada por 11 votos.
O presidente da Câmara negou haver resistências ao texto dos precatórios e também criticou a inclusão de professores na discussão.
Bahia, Pernambuco, Ceará e Amazonas ganharam na Justiça o direito de receber R$ 15,6 bilhões relativos a dívidas de repasses do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério).
“Nós temos essas situações de encaminhamento, temos de novo uma versão que se trata, que traz professores para esse assunto, que absolutamente, não tem nada a ver”, disse. “O débito ou repasses desse percentual de professores vai caber aos estados e municípios, nós não estamos mexendo nessas situações.”
“Isso precisa ser tratado com clareza para não vir aqui a PEC da vingança, depois é a PEC do roubo do magistério, depois é a PEC disso, daquilo, daquilo outro. As PECs são como elas são, elas tratam de precatórios.”
No Senado, além da reação negativa do mercado, parlamentares contrários à PEC afirmam que ela desviará recursos que seriam destinados para a educação. Apesar dessas resistências, líderes do governo e de partidos independentes no Senado consideram que o projeto alcançará os 49 votos necessários para aprovação e que o mais difícil, no momento, é a votação na Câmara.
Eles avaliam que a possibilidade de beneficiar governadores com o chamado encontro de contas vai facilitar a apreciação da proposta no Senado. Pelo mecanismo, os contratos, acordos, ajustes, convênios, parcelamentos ou renegociações de débitos firmados pela União com os entes federativos poderão ser abatidos nos precatórios dos valores devidos pela União.
O fato de a PEC abrir espaço para bancar o novo programa social também é visto como capaz de influenciar na decisão dos senadores.
“Acredito que teremos apoio para aprovar. Estamos tratando de uma questão social, em um momento difícil”, afirma o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO). (Thiago Resende, Danielle Brant e Washington Luiz – Folhapress)