Mercado sobe juros com expectativa de aprovação da PEC Kamikaze
A expectativa de que o governo eleve gastos sociais fora do teto, com a aprovação pelo Congresso da chamada PEC Kamikaze, está fazendo os investidores cobrarem mais caro nas negociações com títulos públicos.
O texto, que abriria as torneiras dos cofres públicos para programas sociais a 100 dias das eleições, tem custo estimado em R$ 38,75 bilhões. Com isso, os contratos de juros futuros, que embutem a expectativa dos agentes de mercado acerca da condução da política fiscal, têm registrado forte alta ao longo do mês de junho.
A taxa do contrato para janeiro de 2023, que era negociada a 13,38% no fechamento de maio, estava ao redor de 13,76% nesta quinta-feira (30).
Parte desse movimento se deve ao ambiente externo, com o Fed (Federal Reserve, Banco Central dos EUA) elevando a taxa de juros americana em 0,75 ponto percentual, diz Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho para América Latina.
Mas, segundo ele, o cenário doméstico de mais gastos públicos faz crescerem as apostas de que o BC brasileiro tenha que estender o ciclo de juros altos para segurar a inflação.
“A discussão não trouxe novidades com relação ao que já havia sido vazado pela imprensa, com volume de gastos extrateto ficando em torno de R$ 39 bilhões. O que o mercado teme, no entanto, não é o impacto previsto, e sim entender o quanto ‘a porta ficou aberta’ para prorrogações ou até aumentos adicionais de gastos mais para frente, principalmente levando em conta que teremos eleições no fim do ano, fato que deve começar a reger os ânimos do mercado a partir do recesso parlamentar do meio deste ano”, diz Victor Beyruti Guglielmi, economista da Guide Investimentos.
“O risco a se monitorar é a elevação dessa conta e a possibilidade de que parte dela se transforme em permanente”, endossam os analistas da XP.
Além da alta nas taxas dos contratos de juros futuros, Rostagno, do Mizuho, destaca ainda a forte alta registrada pelo dólar em junho, próxima de 10%, caminhando para o maior aumento desde março de 2020, quando os mercados financeiros do mundo inteiro foram abalados pelo choque inicial da Covid-19.
Risco global se sobrepõe ao doméstico nesta quinta-feira O estrategista-chefe diz ainda que, embora o risco fiscal siga bastante presente no radar dos investidores, os movimentos de mercado nesta quinta têm como principais balizadores o ambiente externo, com quedas expressivas da principais Bolsas globais, em meio ao risco crescente na visão dos agentes sobre o enfraquecimento da economia em escala global.
Nos Estados Unidos, o índice S&P 500 operava em baixa de 0,8%, enquanto a curva de juros americana também oscilava em baixa, influenciado para o movimento de queda dos juros no Brasil –o contrato do DI para 2023 cedia de 13,79% para 13,76%. “O externo está se sobrepondo ao doméstico”, diz Rostagno.
Dados divulgados nesta quinta no mercado americano mostram que os gastos dos consumidores dos Estados Unidos aumentaram menos do que o esperado em maio, com o aumento dos juros e as condições financeiras mais apertadas alimentando os temores de uma recessão na maior economia do mundo.
Os gastos dos consumidores, que representam mais de dois terços da atividade econômica dos EUA, avançaram 0,2% no mês passado, informou o Departamento de Comércio americano nesta quinta, menor ganho em cinco meses. Economistas consultados pela Reuters projetavam alta de 0,4% dos gastos. Além disso, o dado de abril foi revisado para mostrar aumento de 0,6%, ao invés de 0,9% como relatado anteriormente.
Neste cenário, a gestora de recursos PIMCO avalia ser mais provável haver recessão nos Estados Unidos nos próximos 12 meses do que um cenário sem recessão.
Segundo o diretor global de investimentos de renda fixa da PIMCO, Andrew Balls, a probabilidade de recessão é de cerca de 50% ou um pouco mais.
“Uma recessão não é a única coisa importante. Você verá claramente uma desaceleração significativa do crescimento”, disse Balls. A probabilidade de uma recessão é semelhante na Europa, possivelmente um pouco maior, acrescentou.
(Lucas Bombana – Folhapress /Foto: Diego Padgurschi/Folhapress)