Igualdade Salarial – Novas Obrigações Para as Empresas
Artigo por da Muniz Borges é sócia do FAS Advogados
A publicação da Lei nº 14.611/2023, em 3 de julho, visando fomentar a igualdade salarial, em especial entre homens e mulheres, para realização de trabalhos igual valor ou no exercício da mesma função, torna crucial que as empresa, juntamente com o jurídico e seu departamento de recursos humanos, providenciem as ferramentas necessárias para sua efetiva aplicação.
Na nossa Constituição Federal já há obrigação de igualdade entre todas as pessoas, bem como na própria CLT há critérios objetivos para pagamento de salários iguais (artigo 461 da CLT), como estarem os empregados no mesmo estabelecimento, ter tempo de função não superior a dois anos ou tempo de empresa não superior a quatro anos, por exemplo.
A referida lei altera exatamente a redação do artigo 461 da CLT, garantindo, a partir de agora, adicionalmente:
• No caso de discriminação por motivo de sexo, raça, etnia, origem ou idade, o pagamento das diferenças salariais não afasta o direito a indenização danos morais; e
· No caso de fiscalização administrativa e constatação da discriminação, a multa administrativa a ser imposta será de 10 (dez) vezes o valor do novo salário devido ao empregado discriminado, elevada ao dobro, no caso de reincidência.
Na mesma linha, a nova lei traz uma previsão específica sobre igualdade salarial e critérios de remuneração entre homens e mulheres, impondo às empresas:
· Possuem mecanismos de transparência salarial e de critérios remuneratórios;
· Disponibilização de canais específicos para denúncias de discriminação salarial;
· Promoção e implementação de programas de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho, incluindo a capacitação de gestores, de lideranças e de empregados a respeito do tema; e
· Fomento à capacitação e à formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens.
Rever o organograma da empresa e ter critérios objetivos de promoção e enquadramento salarial tornam-se necessários, pois esse ponto ainda é uma das excludentes do pedido de equiparação salarial da CLT. Da mesma forma, um programa interno estruturado de diversidade, processo seletivo ético e transparente, canais efetivos de denúncia e procedimentos internos para a correta e diligente apuração de alguma falta, serão objetivamente cobrados.
Além dos mecanismos acima, a nova lei também traz a obrigação para empresas com mais de cem empregados de publicar relatórios semestrais contendo salários e critérios remuneratórios. Tais dados deverão seguir a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD e serem anonimizados, permitindo uma análise comparativa entre os salários e proporção de cargos ocupados por homens e mulheres, acompanhados de informações que possam fornecer dados estatísticos sobre outras possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade.
Apesar de a lei fomentar um tema tão relevante e tentar fazer valer a igualdade entre homens e mulheres, sanando a falta de dados confiáveis e transparentes, o primeiro comentário e crítica é a ausência de regulação mais específica de quais critérios e informações o relatório deve possuir, além de sequer mencionar onde a publicação deve ser feita. Um relatório de transparência no sítio eletrônico das empresas será o suficiente para os órgãos fiscalizadores?
Quando for identificada desigualdade (independentemente dos critérios de equiparação da CLT), a empresa deverá apresentar e implementar plano de ação para mitigar a desigualdade, com metas e prazos, garantida a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes dos empregados nos locais de trabalho.
O descumprimento dos pontos acima referentes ao relatório pode gerar a aplicação de multa administrativa corresponderá a até 3% (três por cento) da folha de salários do empregador, limitado a 100 (cem) salários-mínimos, sem prejuízo de outras sanções aplicáveis aos casos de discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens.
Essa obrigação é totalmente inovadora no direito brasileiro, mas há algum tempo houve um grande movimento e fomento para coleta de dados pelo governo, ao menos, quanto a informações de diversidade no contrato de trabalho. Vide a Lei nº 14. 553, de abril deste ano, que obriga as empresas, através da autodeclaração, a coletar dados para identificação do segmento étnico e racial a que pertence o trabalhador.
Por outro lado, a Europa também ganhou recentemente obrigação de reportar ao governo os salários dos empregados (sem anonimização de informações), precisando dar explicações e critérios utilizados quando a diferença entre homens e mulheres for superior a 5% (“Pay Transparency Directive”[1]). A ideia aqui também foi mitigar as diferenças existentes e mapear números até então de difícil acesso.
A fiscalização do Brasil ganhou com mais especificidade um ponto adicional para fiscalizar, ficando a cargo do governo apenas disponibilizar, de forma unificada e preservando a proteção de dados, indicadores atualizados periodicamente sobre mercado de trabalho e renda desagregados por sexo, inclusive indicadores de violência contra a mulher, de vagas em creches públicas, de acesso à formação técnica e superior e de serviços de saúde, bem como demais dados públicos que impactem o acesso ao emprego e à renda pelas mulheres e que possam orientar a elaboração de políticas públicas.
Foto: Pexels
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