Greta faz ato pelo clima em Berlim, a 2 dias de eleição apertada para suceder Angela Merkel

A dois dias das eleições que vão definir o próximo governo da Alemanha, jovens ambientalistas protestaram em várias cidades do país para pedir ações mais contundentes de combate à crise climática.
Em Berlim, Greta Thunberg (foto), ativista sueca que no ano passado foi recebida pela primeira-ministra Angela Merkel, disse em discurso nesta sexta (24) que nenhum dos partidos políticos está suficientemente comprometido com o problema.
Além de Berlim, houve protestos em Bonn, Colônia, Hamburgo e Friburgo, como parte de um movimento programado em 80 países.
O assunto está definitivamente na cabeça dos eleitores. Para 81% dos alemães pesquisados pela ARD-DeutschlandTrend em julho, há necessidade muito grande ou grande de agir na proteção do clima.
No Politbarômetro, levantamento do Forschungsgruppe Wahlen que toda semana pergunta quais são os problemas importantes da Alemanha, clima foi citado na semana passada (17) por 47%, na dianteira das preocupações.
Pode parecer contraditório que apesar disso os Verdes sejam apenas o terceiro partido nos levantamentos de intenção de voto, com 16% na média, enquanto os sociais-democratas (SPD) aparecem com 25%, em empate técnico e em disputa cada vez mais acirrada com os democratas-cristãos (União), com 22%.
Mas isso acontece porque todos os principais partidos, com exceção da ultradireitista AfD, têm propostas para combater a crise climática -as diferenças são com que velocidade e por que meios.
“Trata-se da disputa sobre quão fortemente a política climática deve intervir nos estilos de vida e na economia”, diz Ursula Münch, diretora da Academia de Educação Política em Tutzing.
Os Verdes são pela transição mais rápida: querem que motores a combustão sejam eliminados até 2030. A candidata a primeira-ministra do partido, Annalena Baerbock, defendeu na campanha que até lá os carros a gasolina e a diesel deixem de ser vendidos.
A meta dos Verdes é vista como radical demais pelo candidato da União, Armin Laschet, que vê risco de alto desemprego na indústria automotiva, grande fonte de receitas para o país.
Segundo o conservador, que é contra prazos limites para os veículos, são incentivos de mercado e deduções de imposto que farão a indústria acelerar a transição verde.
Olaf Scholz, candidato social-democrata, por sua vez, diz que é preciso investir em infra-estrutura e rede elétrica de alto desempenho para levar energia limpa às indústrias. Em debates na TV neste mês, ele disse que sua meta é neutralizar as emissões do setor industrial em 25 anos.
Para os ativistas da chamada “geração Greta”, é preciso agir mais rapidamente, o que significa alterar de forma mais intensa o cotidiano de pessoas e empresas.
Uma das queixas dos manifestantes é que a Alemanha não tem cumprido suas metas de redução de emissões de gás carbônico, necessárias para cumprir o Acordo de Paris.
Ao assinar o acordo, a Alemanha e outros 194 países se comprometeram a implantar programas para conter o aquecimento global a no máximo 1,5 grau Celsius acima da temperatura média global do período pré-industrial.
Foi justamente pelo peso da indústria automobilística na economia alemã e na política dos conservadores que o governo de Merkel é avaliado de forma ambígua por ambientalistas.
A própria primeira-ministra foi uma das líderes mais identificadas com o combate às emissões nos anos 1990 e 2000, mas sua abordagem mudou depois da recessão provocada pela crise global de 2008.
Os conservadores trabalharam para assumir metas menos ambiciosas na lei do clima aprovada em 2019, o que acabou sendo contestado na Justiça justamente pela geração Greta.
Os planos de Merkel deixavam a maior parte do fardo para as próximas gerações, argumentaram o movimento Fridays for Future (sextas-feiras para o futuro, liderado por Greta) e entidades como Greenpeace e Amigos da Terra da Alemanha.
A Suprema Corte do país deu razão aos reclamantes e ordenou ao governo que adotasse metas mais duras e deixasse mais claro como elas serão obtidas, numa vitória para os ativistas.
Na ocasião, políticos do SPD -que fazem parte da coalizão governista e ocupam o Ministério do Meio Ambiente- afirmaram que foi a União que barrou em 2019 a adoção de metas mais ambiciosas.
Scholz, que é vice-primeiro-ministro de Merkel, voltou à carga em debate nesta semana, afirmando que o partido de Laschet “tinha dúvidas” sobre a necessidade de aumentar a produção de energia verde. “A CDU/CSU está do lado errado dessa questão tão importante para o futuro industrial da Alemanha”, disse ele.
Para a ativista alemã Luisa Neubauer, que dirige no país o Fridays for Future German, todos estão do lado errado e é preciso elevar a pressão nas ruas antes da votação, neste domingo (26). “Os partidos políticos não levaram a catástrofe climática a sério o suficiente, e os jovens não aceitam mais desculpas sobre o mundo que vão herdar.”
No discurso em Berlim, Greta Thumberg acusou a Alemanha de não fazer nem ao menos o necessário para cumprir as metas acordadas no passado.
Embora as emissões tenham caído em 2020, por causa da pandemia de coronavírus, a retomada deve provocar neste ano uma alta de 6%, o maior aumento em 30 anos, de acordo com o centro de estudos Agora Energiewende.
PROPAGANDA ELEITORAL TAMBÉM PREOCUPA AMBIENTALISTAS
A questão ambiental movimenta também um aspecto bem mais corriqueiro das eleições alemãs: os cartazes de propaganda dos candidatos.
Sua exposição é permitida e até protegida por lei, e há regras detalhadas sobre onde eles podem ser colocados, onde são proibidos -em escolas e prédios públicos, por exemplo.
Nas cidades visitadas pela Folha de S.Paulo, o volume de propaganda é modesto e se concentra nas ruas principais. Em Gelsenkirchen, na região oeste do país, o mais comum era que houvesse no máximo um cartaz por poste.
Em Hassloch, mais a sudoeste, há postes nos quais se empilham até quatro pôsteres diferentes, e também é possível notar que alguns foram arrancados.
Em cidades maiores, como Berlim, regiões de maior passagem de pedestre podem ter acúmulo dessa propaganda, como mostram fotos em sites jornalísticos.
Estados e municípios também determinam quando eles podem começar a ser colocados -por volta de seis semanas antes da votação-, e em quanto tempo precisam ser retirados.
Em geral, partidos devem mobilizar suas equipes para limpar todos os postes em no máximo duas semanas depois da eleição, para evitar multas. Em Berlim, o prazo é de uma semana.
É nesse ponto que começa o problema: qual o destino dessas centenas de milhares de cartazes? Ativistas ambientais reclamam que parte deles não pode ser reciclada e acaba nos incineradores de lixo, provocando desperdício e poluição.
Entidades começaram campanhas para que partidos mandem fazer seus pôsteres não de carvão, mas de polipropileno -um plástico de alta qualidade, ideal para reciclagem.
O papelão, afirmam, costuma ser tratado com produtos químicos para sobreviver à chuva, e isso torna esses cartazes inadequados para a reciclagem.
Merkel foi de ‘chanceler do clima’ a ‘rainha das montadoras’ “A questão do aquecimento global é, na minha opinião, uma das questões ambientais mais importantes com a qual temos que lidar”, disse em 1995 Angela Merkel, apontada como ministra do Meio Ambiente pelo premiê Helmut Kohl.
Nesse mesmo ano, foi ela que organizou em Berlim a primeira COP (conferência da ONU sobre a crise do clima), que chega agora à 26ª edição.
De lá para cá, sua atuação na área oscilou e divide opiniões dos cientistas e ativistas da área. A economia alemã é a sexta maior emissora de carbono do mundo, e quase um terço da eletricidade vem de termelétricas movidas a carvão ou linhito, combustíveis altamente poluentes.
As emissões alemãs de carbono per capita são maiores que as do Reino Unidos e as da França, segundo a Edgar (base de dados de emissões para pesquisa global atmosférica, na sigla em inglês): 9,4 toneladas por pessoa na Alemanha, contra 5,6 e 5,1 nos outros dois principais países europeus.
Um sinal de que pouca coisa avançou talvez seja o discurso da própria Merkel em julho deste ano, falando a estudantes americanos da Universidade Johns Hopkins. Passados 26 anos depois da declaração como ministra, ela continua descrevendo a crise climática “o desafio de nossos tempos”. (Ana Estela de Sousa Pinto – Folhapress)

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