Empreendedor busca solução em conta para ser mais digital
Uma pesquisa recente apresentada pela Fundação Getulio Vargas em parceria com a ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial) mostrou que a maturidade digital das micro e pequenas empresas brasileiras ainda é baixa. Em uma escala de 0 a 100, o índice médio ficou em 40,77 pontos.
O setor de serviços apresentou os melhores resultados (pontuação média de 43,73), enquanto o de comércio teve menor pontuação: 36,75. Já a média de pontos do setor industrial ficou em 40,49. O levantamento feito ao longo de 2021 foi intitulado “Mapa de Digitalização das Micro e Pequenas Empresas Brasileiras”.
Novos empreendedores têm tido mais contato com alternativas de digitalização, como ocorre com a fotógrafa Suiane Sant’Ana, 33. Com a queda da demanda por seu trabalho durante a pandemia, ela resolveu se tornar MEI (microempreendedor individual) para ter uma fonte de renda.
Após participar de cursos de capacitação no Sebrae, Suiane aprendeu a fazer artesanato com artigos de couro e criou a Sant’AR Coleiras.
A marca de acessórios para pets usa conceitos da moda para fugir da estética infantilizada desse tipo de produto. O investimento foi de R$ 10 mil, e 30% desse valor foi usado para criar um site e impulsionar as vendas digitais.
“Não tem sido fácil manter os investimentos em tecnologia, mas é importante para a visibilidade do site, uma vez que não temos ponto físico”, diz. “Minha pretensão é ofertar, juntamente com a coleira, uma tag de identificação que armazene dados do animal, mas isso exigirá um investimento muito maior.”
A percepção sobre a importância de impulsionar um negócio que já nasceu digital também é compartilhada por Karine Camucci, que criou, em 2020, uma consultoria de recolocação profissional. A Você Empregado surgiu justamente depois que ela foi demitida de uma multinacional do setor automotivo.
“Tive que desenvolver competências que não tinha enquanto CLT, como em relação a marketing e vendas. Quando os recursos estavam mais equilibrados, priorizei a criação do site para divulgação dos serviços de consultoria e o desenvolvimento de uma landing page [página estática] para ajudar na captação de interessados no meu curso online”, conta.
O primeiro passo foi abrir uma conta no Instagram. A compra do domínio, mesmo, só veio um ano depois. Atualmente, a prospecção de clientes é feita por aplicativos de mensagens e pelas redes sociais, enquanto os atendimentos ocorrem via Google Meet. No segundo semestre, Karine pretende investir em marketing digital.
Já no caso da Materlap, uma empresa de coworking, as ferramentas tecnológicas ajudam a organizar o fluxo de clientes no espaço físico, que foi criado pela pedagoga Isabella Moreira, 32, e pela educadora parental Marina Zirpoli, 33.
A companhia aberta em 2019 fica em Santana, na zona norte da capital paulista. No local, há espaço para o trabalho remoto e, também, para os filhos pequenos dos clientes brincarem.
Elas utilizam um software para gerenciamento, mas, segundo Marina, o próximo passo é buscar ferramentas personalizadas. “Está no nosso planejamento adotar um aplicativo próprio para controle de gestão, agendamento e reserva de salas e horários, além de uma agenda eletrônica para comunicação com as famílias sobre o dia a dia das crianças em nosso espaço.”
Em relação a startups, que já têm uma base tecnológica estruturada, os investimentos em inovação, sobretudo voltados para personalizar o negócio, são naturalmente maiores. Einat Eisler Carasso, 35, CEO do Freshmania –que entrega produtos lácteos frescos– afirma que a tecnologia é a “coluna vertebral” de seu tipo de negócio, inserido no ramo de foodtech.
“O que os consumidores veem no site [e-commerce] é a ponta do iceberg, mas, existe todo um sistema que garante administração do estoque, controle do picking [método de separação de pedidos] e das entregas”, diz a empresária, que contou com investidores independentes para conseguir um aporte inicial de R$ 2 milhões em tecnologia, marketing e logística.
“Desenvolvemos nosso próprio sistema para que responda integralmente e de forma personalizada às necessidades dos clientes e parceiros.” Segundo Einat, a plataforma ajuda a não ter desperdício de alimentos, uma vez que, por trabalhar com produtos frescos e perecíveis, não há estoque.
Já o empresário Jair Romano Jr., 35, adquiriu a licença de utilização da plataforma de uma empresa parceira, a Evolve Tec, para adotar a ferramenta CRM Lask na franquia da marca de calçados Perky Shoes, da qual é dono, no Mooca Plaza Shopping (zona leste de São Paulo). O sistema funciona por meio de geolocalização e mecanismos de inteligência artificial “para capturar potenciais clientes e melhorar o fluxo offline do comércio”, diz Romano.
O especialista em Tecnologia, Inovação e Tendências Arthur Igreja explica que plataformas desse tipo são importantes para pequenas e médias empresas, que têm menos condições de investir em soluções customizadas.
Ele afirma que companhias desse porte não podem errar no relacionamento com o cliente e precisam de ferramentas de gestão “para ter o negócio na mão, pois as grandes corporações têm um poderio muito maior para fazer tudo isso e até desenvolver internamente o que for necessário”.
Na avaliação de Jean Tom-ceac, professor da Trilha de Tecnologia da Faculdade Sebrae, não há uma porcentagem predeterminada do investimento disponível em uma empresa para destinar aos recursos tecnológicos.
“Tudo depende de quanto, como e quando o investimento em um produto ou serviço de tecnologia deve dar retorno financeiro”, diz o professor. Para chegar a uma estimativa, de acordo com ele, é fundamental utilizar métricas para medir performance, como a Key Performance Indicator, conhecida pela sigla KPI.
Entretanto, falar em inovação tecnológica no empreendedorismo não necessariamente significa dispor de muito dinheiro.
“As empresas ainda associam a transformação digital a tecnologias muito complexas. Mas, para a realidade dos pequenos negócios, por exemplo, estamos falando de mudanças simples, como montar um perfil [da empresa] na rede social sem custo algum”, diz Adryelle Pedrosa, gerente da Unidade de Transformação Digital da ABDI.
Para vendas online, por exemplo, a especialista afirma que não há necessidade de estruturar uma plataforma própria no início, mas, sim, comercializar os produtos por meio de marketplaces já existentes “até perceber que já amadureceu e, então, poder desenvolver seu próprio software ou aplicativo”.
(Marcela Marcos – Folhapress /Foto: Tânia Rêgo – Agência Brasil)