Consumo na rua estimula serviços, e só combustíveis se salvam no varejo
Com o avanço de atividades voltadas para empresas e o retorno do consumo presencial das famílias, o setor de serviços permaneceu como protagonista na economia brasileira em julho.
O varejo, por outro lado, patinou no início do segundo semestre, em um contexto marcado pela inflação ainda elevada e pelos juros altos, sinalizam dados de pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Em julho, o volume de serviços cresceu 1,1% ante junho, o terceiro avanço consecutivo. Com o resultado, ampliou a distância em relação ao pré-pandemia. Agora, está 8,9% acima do nível de fevereiro de 2020, antes das restrições forçadas pela Covid-19.
No sentido contrário, o volume de vendas do varejo caiu 0,8% em julho, terceiro mês consecutivo de taxas negativas. Assim, reduziu a distância positiva em relação ao pré-pandemia. Ficou apenas 0,5% acima de fevereiro de 2020.
Dentro do varejo restrito, somente 1 das 8 atividades pesquisadas teve desempenho positivo em julho.
Trata-se do segmento de combustíveis e lubrificantes, cujas vendas subiram 12,2% em relação a junho.
É como se o consumidor enchesse o tanque do carro e diminuísse o carrinho de compras em outras áreas do comércio. A maior queda entre os segmentos do varejo, de 17,1%, foi registrada por tecidos, vestuário e calçados.
Para analistas, combustíveis e lubrificantes se salvaram devido ao alívio tributário recente. Pressionado pela inflação às vésperas das eleições, o presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou em junho a lei que definiu o teto para cobrança de ICMS (imposto estadual) sobre produtos como a gasolina. A medida contribuiu para a queda dos preços nas bombas dos postos.
“O varejo tem um cenário mais preocupante. Parte das pessoas está procurando consumir mais serviços e menos bens agora”, afirma o economista Luca Mercadante, da Rio Bravo Investimentos.
“O setor de serviços havia perdido muito no começo da pandemia”, acrescenta o economista, em referência às restrições forçadas pela Covid-19.
As medidas restritivas abalaram os serviços porque o setor reúne empresas dependentes do contato direto com clientes. É o caso de bares, hotéis, restaurantes e eventos.
De acordo com o IBGE, os serviços prestados às famílias, que envolvem alojamento e alimentação, avançaram 0,6% em julho, mês tradicional de férias.
Foi o quinto mês consecutivo de alta. Apesar da sequência positiva, ainda estão 5,7% abaixo do pré-pandemia.
Segundo o IBGE, o que puxou o setor de serviços para cima ao longo da crise sanitária foram atividades que costumam ter outras empresas como clientes, como as de tecnologia da informação e transporte de cargas.
Em julho, os transportes no geral cresceram 2,3%, enquanto os serviços de informação e comunicação subiram 1,1%, indicou o IBGE. Os segmentos estão 20,2% e 13,3% acima do pré-coronavírus, respectivamente.
“Estamos em um processo de normalização da cesta de consumo. Os serviços, até pela demanda reprimida, continuam se destacando”, diz a economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas). Ela pondera que, passados os efeitos da reabertura, o setor tende a perder ímpeto.
As pesquisas mensais do IBGE englobam ainda a produção industrial. Em julho, a produção das fábricas até teve variação positiva de 0,6%, após recuo de 0,3% no mês anterior. Mesmo com o alívio, o indicador ainda está 0,8% abaixo do pré-pandemia.
De acordo com analistas, a indústria sente a restrição na oferta de parte dos insumos, apesar da melhora recente do quadro. O custo de produção elevado é outro fator apontado como desafio.
Segundo o economista Eduardo Vilarim, do banco Original, a indústria, ao lado do comércio, também é impactada antes pelo aumento dos juros. “As atividades são bem heterogêneas”, aponta.
“Os serviços estão indo muito bem, em parte porque estavam represados. As pessoas, que antes consumiam mais bens, agora consomem serviços.”
No segundo trimestre deste ano, o PIB (Produto Interno Bruto) cresceu 1,2%, de acordo com o IBGE. O resultado foi puxado por serviços. Economistas veem espaço para novos avanços do setor até o final de 2022.
Com isso, é provável que o PIB volte a ter variação positiva no terceiro trimestre, mas abaixo de 1%, e fique mais próximo de zero ou até negativo nos três últimos meses do ano. A possível perda de fôlego é associada aos efeitos defasados da alta dos juros.
No acumulado de 2022, a mediana das projeções do mercado financeiro indica crescimento de 2,39% para o PIB, conforme o boletim Focus, divulgado pelo BC (Banco Central). Casas como o Original e a Rio Bravo projetam alta de 2,7%.
(Leonardo Vieceli – Folhapress / Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)