Brasil deve crescer menos que a média da América Latina, diz Banco Mundial
O Brasil deve registrar neste ano um crescimento econômico abaixo da média dos vizinhos da América Latina e Caribe, segundo relatório do Banco Mundial publicado nesta terça-feira (4).
Pelas estimativas do órgão, enquanto a média do PIB (Produto Interno Bruto) da região crescerá 3%, no Brasil essa taxa deve ficar em 2,5% -projeção do Banco Central brasileiro é mais otimista e prevê crescimento de 2,7% ao fim do ano.
Entre as maiores economias da região, o Brasil deve ter crescimento maior que o México (1,8%) e o Chile (1,8%), mas abaixo da Argentina (4,2%), Colômbia (7,1%) e Peru (2,7%).
A previsão do PIB por si não revela outros fatores importantes das economias locais -a Argentina, por exemplo, chegou a setembro com inflação anual de 78,5% -mas mostra a dificuldade em acelerar o crescimento econômico no pós-pandemia.
O dado é divulgado em um momento em que o atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), propagandeia em sua campanha de reeleição que o Brasil foi o país que melhor se recuperou da crise mundial. Reportagem da Folha de S.Paulo no mês passado mostrou que desde os governos Dilma Rousseff e Michel Temer (2011-2018) o Brasil tem crescimento abaixo da média global, e deve repetir essa tendência com Bolsonaro.
Segundo o relatório, na maior parte dos países da região o PIB e os índices de emprego estão no mesmo nível pré-pandemia, com sistemas bancários sólidos e encargos da dívida administráveis. O cenário previsto pelo Banco Mundial agora é mais positivo do que a previsão feita em abril, quando a Guerra na Ucrânia estava mais aquecida e a instituição esperava que a América Latina crescesse 2,3%.
Para o ano seguinte, a previsão é menor. O Brasil deve crescer 0,8% em 2023, segundo o estudo, metade da média regional, de 1,6% -o BC aponta crescimento de 2,5% no ano que vem. Já em 2024, a previsão é que o Brasil veja seu PIB subir 1,8%, enquanto na América Latina e Caribe o aumento esperado é de 2,3%.
A previsão para 2023 é menor do que no último relatório, de abril, e o Banco Mundial aponta uma série de motivos para isso. Primeiro, o impacto contínuo da guerra na Europa, que até aqui vinha afetando de maneira mais branda a região em relação a outros países. Também pesam uma previsão de queda de 10% no preço das commodities no ano que vem, após crescimento em 2022; a desaceleração dos países do G7 e da China (grandes parceiros econômicos da região); e o aumento das taxas de juros mundo afora -o Fed, o banco central americano, deve subir os juros em mais 2,5 pontos percentuais.
Esse crescimento a 1,6% para o ano que vem está próximo do que a região viu ao longo da década de 2010, e por isso é classificado como “medíocre, mas resiliente” pelo Banco Mundial. São taxas “baixas e insuficientes para realmente reduzir a pobreza ou influir na prosperidade”, diz o relatório. “Sugerem, se não uma armadilha de crescimento, pelo menos a continuidade de um desempenho medíocre.” Segundo a instituição, é preciso investir a longo prazo em infraestrutura, educação e inovação tecnológica.
Uma das explicações para a continuidade do crescimento econômico, ainda que baixo, é a menor exposição dos países às flutuações do dólar de empréstimos estrangeiros, com reservas mais fortes.
Também nota-se, segundo o Banco Mundial, que as preocupações quanto à inadimplência de empréstimos a empresas e consumidores não se concretizaram na maioria dos países, mas, diante do risco, “os governos terão que simplificar os mecanismos de resolução de dívidas, que atualmente são difíceis de controlar, e monitorar a solidez econômica”, sugere o relatório.
Segundo o Banco Mundial, as taxas de inflação na região, nos patamares de 10% e 8,3%, com exceção de Argentina e Venezuela, estão alinhadas a países membros da OCDE, ainda que tenham excedido as metas dos bancos centrais, o que afeta o orçamento das famílias e agrava a pobreza.
A inflação, contudo, não deve aliviar no futuro, segundo apontam uma série de fatores. Primeiro, continuam altos os agregados monetários -disponibilidade de moeda em poder do público e depósitos bancários à vista. Além disso, o crescimento dos preços dos insumos, pelas interrupções nas cadeias de suprimentos e pela guerra na Europa, superou o aumento dos preços ao consumidor, e essa diferença deve ser repassada em algum momento.
Chama atenção também o aumento do déficit fiscal na região, com queda de receitas dos governos e aumentos de gastos para resguardar famílias e empresas durante a pandemia. Em todo o continente, a proporção média da dívida pública em relação ao PIB teve um aumento de 15 pontos, chegando a 75,4% do PIB ao fim de setembro de 2021. Com a recuperação deste ano, essa taxa regrediu para 70%, ainda suficiente para frear grandes investimentos em capital ou em aumento de produtividade, diz o relatório.
“Administrar os encargos mais elevados da dívida decorrente da crise e criar espaço fiscal suficiente para investimentos que promovam o crescimento requer a cuidadosa consideração de novas fontes de receita, bem como o melhor uso dos gastos existentes”, diz William Maloney, economista-chefe do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe.
Segundo o órgão, a maior parte da receita governamental da América Latina vem de impostos sobre valor agregado, ou seja, impostos sobre consumo, o equivalente a 23,7% do total, o que é alto pelos padrões globais. Já o Imposto de Renda de pessoas jurídicas soma 13,2% das receitas. Por fim, o Imposto de Renda de pessoas físicas equivale a 10,6%, baixo em relação a outros países de economia avançada.
Para aumentar as receitas, os governos da região têm considerado aumentar o Imposto de Renda de pessoas físicas, hoje equivalente a 2,6% do PIB, mas a medida tem efeitos mais negativos em países com carga tributária geral já alta, como Brasil, Colômbia, Argentina e Uruguai. Já na Bolívia, Equador, México, Paraguai e em uma série de países da América Central, há mais margem para aumento do imposto.
Mas, segundo o Banco Mundial, cerca de 40% dos ajustes fiscais na América Latina e Caribe vêm da redução de investimento público, o que pode ter impactos negativos consideráveis, defende o órgão, já que esses gastos se pagam a médio e longo prazo. Esse tipo de corte é mais simples porque enfrenta pouca resistência, uma vez que o público-alvo mais dependente do governo é, em geral, pouco articulado.
É mais efetivo, no entanto, apostar em gastos mais eficientes, defende o Banco Mundial, que cita estudo segundo o qual cerca de 17% dos gastos na região são feitos por programas de transferência mal direcionados, práticas ruins de compras e políticas de recursos humanos ineficientes. O gasto ineficiente não estimula a renda, e seu corte tem poucos efeitos negativos na economia, diz o estudo.
(Thiago Amâncio – Folhapress /Foto: Diego Padgurschi /Folhapress)