Boris Johnson escapa de voto de desconfiança e continua como premiê do Reino Unido
O premiê do Reino Unido, Boris Johnson, teve uma importante vitória nesta segunda-feira (6) no voto de desconfiança que sua própria legenda, o Partido Conservador, convocou contra ele.
Boris precisava do voto de 180 dos 359 parlamentares da sigla para permanecer no cargo –caso contrário, seria iniciado um processo de semanas para eleger o novo chefe de governo britânico. A votação nesta segunda terminou com 211 votos favoráveis ao premiê, contra 148 contrários.
A consulta foi feita após 54 correligionários –15% da bancada conservadora– enviaram cartas solicitando a votação ao chamado Comitê 1922. A última necessária para completar a lista chegou na noite de domingo (5), quando Boris foi notificado, segundo Graham Brady, que preside o órgão.
Ao menos 40 parlamentares já haviam pedido publicamente a saída de Boris nas últimas semanas, mas os últimos solicitantes, explicou Brady, enviaram suas cartas apenas nos últimos dias, porque insistiam que a votação fosse realizada somente após as celebrações do Jubileu de Platina de Elizabeth 2ª, organizadas de quinta (2) a domingo.
A rainha, no discurso de encerramento das celebrações pelos seus 70 anos de reinado, pediu que o sentimento de união prevalecesse no país.
O gabinete do premiê, por meio de um porta-voz, havia dito que a votação desta segunda era uma oportunidade para Boris apresentar seus argumentos aos parlamentares e uma chance de “encerrar meses de especulação”.
Boris entrou na mira de seus correligionários após participar de uma série de festas em Downing Street, a sede do governo do Reino Unido, em períodos nos quais a Inglaterra passava por restrições para conter a pandemia de Covid. Os episódios ficaram conhecidos como “partygate” e foram investigados pela polícia de Londres e pelo próprio governo.
O escândalo foi ganhando corpo ao longo dos últimos meses conforme se intercalavam revelações baseadas em fotos dos eventos com pedidos de desculpas do político –ao Parlamento, à própria rainha, aos ingleses. Ao ser questionado no Parlamento em dezembro sobre os relatos de uma festa em Downing Street, o premiê disse ter certeza que “as regras foram seguidas o tempo todo”.
Com o agravamento da crise, em janeiro ele pediu perdão pela primeira vez por participar de um dos encontros durante o lockdown. À época, disse ter acreditado que se tratava de um evento de trabalho –já que o jardim da residência oficial funciona, segundo ele, como extensão do escritório.
Depois, se desculpou também com Elizabeth 2ª por causa de uma das festas de sua equipe, realizada na véspera do funeral do marido dela, o príncipe Philip. Segundo o britânico Telegraph, funcionários do gabinete quebraram regras do confinamento, beberam álcool em abundância e dançaram até tarde na despedida do diretor de comunicação James Slack e de um fotógrafo.
O premiê e a esposa chegaram a ser multados por uma festa de aniversário dele. A polícia britânica emitiu mais de 126 punições do tipo em conexão com os eventos na sede da administração britânica. Apesar desse desenrolar, Boris sempre negou a possibilidade de renunciar ao posto.
A oposição esperava fazer valer o código parlamentar, segundo o qual enganar conscientemente os legisladores é uma ofensa que deve resultar em renúncia. Angela Rayner, vice-líder do Partido Trabalhista, acusou no final do mês passado o primeiro-ministro de mentir. “Boris Johnson afirmou repetidamente que não sabia nada sobre desrespeitos à lei –agora não há dúvidas de que ele mentiu”, afirmou. “Ele fez as regras e então as quebrou.”
Os pedidos de renúncia vieram também de membros do próprio partido. O ex-líder do Partido Conservador Mark Harper, por exemplo, escreveu nas redes sociais que não achava mais que o político fosse “digno do cargo que ocupa” depois da última revelação de fotos dos eventos, obtidas pelo canal ITV News. As imagens, supostamente feitas durante uma reunião em homenagem ao ex-diretor de comunicações Lee Cain, mostram Boris fazendo um brinde enquanto segura uma taça.
A situação econômica do país também prejudicou Boris. O Reino Unido enfrenta uma crise do custo de vida impulsionada pelo aumento da inflação, que, em abril, atingiu seu nível mais alto em mais de 40 anos. Derrotas de seu Partido Conservador nas eleições regionais indicaram o ponto que o desgaste político vinha alcançando –ainda que o revés estivesse mais no campo simbólico, já que os milhares de assentos em conselhos municipais e distritais não têm, em tese, impacto direto na política nacional.
A antecessora de Boris no cargo, a também conservadora Theresa May, foi levada a um voto de confiança em dezembro de 2018, em uma reviravolta que girava em torno da separação britânica da União Europeia (UE), o brexit. Ela venceu a votação por 200 votos a 117.
O desgaste, no entanto, foi inevitável, e a primeira-ministra viu ruir sua base de apoio. Poucos meses depois, em maio do ano seguinte, May renunciou ao cargo.
(Folhapress /Foto: Romena Fogliati/Folhapress)